PRESÍDIO POTIGUAR TEM ‘SERÍSSIMAS SEMELHANÇAS’ COM PRÁTICAS DE TORTURA REALIZADAS EM ABU GHRAIB, DIZ RELATÓRIO

Foto: Anderson Barbosa/G1

Alcaçuz, a maior penitenciária do Rio Grande Norte, está sendo comparada a Abu Ghraib, o presídio iraquiano que foi centro de tortura durante o regime de Saddam Hussein e escândalo mundial após a divulgação de imagens de presos sendo humilhados e torturados por soldados americanos em 2004.

Segundo o ‘Relatório de Monitoramento de Recomendações: Massacres Prisionais dos Estados do Amazonas, do Rio Grande do Norte e de Roraima’, documento que será apresentado à imprensa nesta quarta-feira (28), presos potiguares estão sendo vítimas de violência física e psicológica com “seríssimas semelhanças” às sofridas pelos detentos iraquianos.

O texto traz relatos de casos de humilhação coletiva, desnudamentos, maus-tratos e constrangimentos de mulheres grávidas e crianças parentes de presos. Também há denúncias  de agressões extremas, como espancamentos, dedos fraturados e até desmaios causados por enforcamento com cassetete.

Tais violências atacam a dignidade humana, ainda de acordo com o relatório, e vêm ocorrendo há quase dois anos, depois que agentes penitenciários de uma força-tarefa nacional e do próprio estado retomaram o controle da unidade. O ‘Massacre de Alcaçuz’, como ficou denominada a matança de 26 detentos em janeiro de 2017, é o episódio mais sangrento da história do sistema carcerário potiguar.

O documento, que é fruto de visitas feitas no início deste ano aos três presídios que foram palco de massacres ocorridos em janeiro de 2017 no país. Além dos 26 que tombaram em Alcaçuz, na Grande Natal, 33 presos foram mortos na Penitenciária Agrícola de Monte Cristo, em Boa Vista, e outros 60 no Complexo Penitenciário Anísio Jobim, em Manaus.

O relatório foi elaborado por uma missão composta por membros do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT) e do Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (CNPCT). Ambos são órgãos da União que atuam de forma independente, mas que funcionam em conjunto com o Ministério dos Direitos Humanos.

Além de trazer à tona denúncias de abusos e casos de maus-tratos, o relatório ainda cobra do poder público soluções para a superlotação em Alcaçuz e informações sobre detentos, que após quase dois anos da carnificina, ainda são considerados ‘desaparecidos’. A Sejuc diz que 16 presos, não localizados na recontagem, simplesmente fugiram. Já o Mecanismo e o Comitê, trabalham com uma lista de 32 internos sem paradeiro.

“O Mecanismo e o Comitê ponderam sobre as informações contraditórias e incompletas dos órgãos de Estado quanto às pessoas presas e apontam que a classificação de ‘foragido’ para 17 presos não é consistente, além dos 15 que a administração penitenciária e o Sistema de Justiça não prestaram nenhuma informação. Considerando o conjunto de fatores envolvidos nesses casos, entre eles a não realização de perícia adequada, pode-se averiguar indícios de desaparecimento forçado, prática identificada na ditadura brasileira e definida na Convenção Internacional que o Brasil firmou em 2007″, frisa a perita Ana Cláudia Camuri.

No estado, nenhuma família dos internos mortos recebeu qualquer indenização. E, até então, ninguém foi punido ou responsabilizado pela matança – sendo que o inquérito aberto não apura responsabilidade de nenhum agente público.

O relatório também foi produzido com o intuito de dar transparência a uma série de recomendações feitas após os massacres aos poderes executivo, legislativo e judiciário dos três estados. Porém, pouco ou quase nada mudou. No Rio Grande do Norte, por exemplo, de 73 recomendações feitas pelos órgãos antitortura, apenas 1 delas foi cumprida (a realização de concurso público para agentes penitenciários).

Por Anderson Barbosa e Norton Rafael/ Do G1/RN

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