POR PROCÓPIO JÚNIOR: NATAL DE TEMPOS EM TEMPOS

Foto: Beco da Lama – Cidade Alta

Aos que procuram guardar na memória um tempo criança vivido nos limites da cidade do Natal; aos que costumam colher lembranças de momentos arrebatadores e arquivar, em seus corações, instantes tão vivos que provocam uma bi-locação sentimental, o autor ofereçe esta obra como um compêndio histórico desta Cidade dos Reis Magos.

De acordo com Procópio Júnior, Natal de Tempos em Tempos busca realizar um retrato descritivo das ruas, praças, casarões, personagens, costumes e fatos da cidade do Natal, que o tempo distanciou, mas que continua presente na sua história como marco da sua imortalidade.

O autor narra sobre o tempo de antes e de agora. Sobre logradouros inesquecíveis e eventos raros. Escreve sobre os insurretos de 1935; sobre o Campo de Concentração Potiguar no período da 2ª Guerra Mundial. Lembra os heróis dos raids náuticos e andantes. Escreve sobre os primeiros bairros da cidade como também sobre suas ruas renomeadas, mas que guardam, por pirraça, os nomes primitivos. Lembra logradouros como o Tabuleiro da Baiana, o Beco da Lama, as Pontes sobre o Potengi. Refere-se às andanças da Coluna Capitolina, além das inesquecíveis entidades que têm a Rádio Educadora do Natal – REN, como um dos seus marcos pioneiros.

O BECO DA LAMA

A atual Rua Dr. José Ivo, popularmente conhecida como Beco da Lama, localizada no bairro da Cidade Alta, durante a sua secular existência, já mudou de nome várias vezes. Durante muitos anos, foi conhecida como Rua do Meio, por se localizar entre a Avenida Rio Branco e a Rua Gonçalves Lêdo. Com o tempo, passou a ser conhecida como Rua da Luz, pelo fato de Maria da Luz, parteira da cidade, residir na esquina daquela rua com a Rua João Pessoa. Posteriormente, em obediência ao Decreto Municipal de 13/02/1888, passou a se chamar Rua Felipe Camarão, sendo esta denominação substituída por Vaz Gondim para, finalmente, chamar-se Dr. José Ivo.

O Beco da Lama, hoje notoriamente conhecido em todos os pontos cardeais da cidade do Natal, serve como arcádia aos intelectuais, boêmios e cultuadores das artes. Palco diuturno de amizades grandes e brigas maiores, não foi, em princípio, o detentor primeiro dessa enlodada designação.

Do final do séc. XIX para a primeira metade do séc. XX, a Rua Voluntários da Pátria (à época Beco Novo), prolongava-se ligando a Praça Padre João Maria (à época Praça da Alegria) à Rua Ulisses Caldas, cortando em seu trajeto a Rua Coronel Cascudo. O

trecho compreendido entre a Rua Coronel Cascudo e a Rua Ulisses Caldas, e que está registrado no Mapa da Cidade do Natal, elaborado em 1864, e publicado no Atlas do Império do Brasil, de Cândido Mendes de Almeida, passou a ser conhecido como Beco da Lama, por tratar-se, segundo Luís da Câmara Cascudo, de um trecho enlameado.

Entre os anos de 1937 e 1945, o Beco da Lama foi fechado, passando esse acesso a fazer parte dos quintais das casas localizadas às Ruas da Conceição e Vigário Bartolomeu. Existe ainda hoje, na esquina da Rua Vigário Bartolomeu com a Coronel Cascudo, uma casa violentada pela ação do tempo e pelas mãos dos homens. Esse imóvel é testemunha do meu nascimento e dos meus primeiros trinta anos. Recordo-me que no quintal dessa casa, existia um tripé de ferro como se fosse um suporte para mastro de bandeira e, de cima do muro da minha meninice, no quintal da casa vizinha, onde residia o Coronel Quincó, eu avistava um banco de pedra branco, igual aos que eram utilizados na Praça Padre João Maria, lembrando, solitário, a existência de um antigo logradouro naquele local.

Com o desaparecimento do Beco da Lama original, a rua hoje denominada Dr. José Ivo, no trecho compreendido entre a Rua Ulisses Caldas e Rua João Pessoa, passou a ser a herdeira natural do apelido que pertencia outrora ao acesso da Rua Coronel Cascudo à Rua Ulisses Caldas. Hoje, o atual Beco da Lama encontra-se divorciado do sentido pejorativo estabelecido pelos primitivos habitantes da cidade. Através do respaldo dos seus artistas e das peregrinações etílicas dos seus habitués, vive a sua destinação, caracterizando-se, na permutação das letras na frase agora enunciada, no Beco da alma poética e boêmia da cidade do Natal.

Sobre o autor: Manoel Procópio Júnior é pesquisador, escritor, procurador aposentado da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte – ALRN, advogado, mestre maçom e membro do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte – IHGRN, e da Academia Maçônica de letras do Rio Grande do Norte – AMLERN.

Do portfólio literário de Manoel Procópio Júnio, brindaremos os leitores do Blog, a cada domingo, com as crônicas do livro Natal de Tempos em Tempos, que “busca realizar um retrato descritivo das ruas, praças, casarões, personagens, costumes e fatos da cidade do Natal, que o tempo distanciou, mas que continua presente na sua história como marco da sua imortalidade”, conforme ressalta o autor.

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