DEPOIS DE REPASSAR BENS À IRMÃ, ROMÁRIO TRANSFERE CRÉDITO DE R$ 22 MILHÕES A ADVOGADO

Imagem: Lucio Bernardo Jr./CD

Senador colocou ex-assessor parlamentar como dono de parte de seu patrimônio

Acusado em processos judiciais de transferir bens a terceiros para não pagar dívidas com credores, o senador Romário (Pode-RJ) passou a colocar o próprio advogado como dono de parte do seu patrimônio. Luiz Sérgio de Vasconcelos Júnior, que entre 2017 e 2019 foi funcionário comissionado no Senado, foi autorizado, por meio de documentos firmados em cartório, a receber R$ 22 milhões em verbas que seriam de direito do ex-jogador.

Ao longo das últimas duas décadas, Romário vem sendo cobrado na Justiça por uma série de dívidas milionárias — em 2009, um imóvel no condomínio Golden Green foi leiloado por R$ 8 milhões para pagar um credor. Empresas e pessoas físicas que cobram o senador na Justiça costumam ter dificuldades de encontrar patrimônio no seu nome. Há dois anos, O GLOBO revelou que Romário havia transferido para a própria irmã, Zoraidi Faria, bens como uma lancha, um Porsche e uma casa na Barra da Tijuca. Um levantamento feito na ocasião mostrou que o senador e duas de suas empresas eram cobrados por pelo menos R$ 36,7 milhões em dívidas com a União, outras empresas e pessoas físicas.

“Não é preciso maior dilação para se concluir pela ocultação de patrimônio para fraudar credores”, escreveu a juíza responsável por um dos processos na Justiça do Rio.

Nos últimos meses, o advogado Luiz Sérgio de Vasconcelos Júnior passou a ter direito sobre o patrimônio do senador a partir de dois movimentos. O primeiro diz respeito a um acordo com o Vasco para o recebimento de R$ 15,1 milhões de dívidas da época em que Romário atuou no clube. Em 2018, uma construtora que cobra o senador na Justiça devido a um litígio referente ao antigo Café do Gol (restaurante aberto nos anos 1990 por Romário) conseguiu penhorar o valor, pago em parcelas mensais.

Em janeiro do ano passado, o clube interrompeu os pagamentos, e o senador sequer se manifestou na ação. Em seguida, Romário transferiu a Luiz Sérgio os direitos aos R$ 15,1 milhões, a título de honorários, por meio de um acordo em cartório. A partir daí, o advogado acionou o Vasco, e uma nova tratativa foi finalizada. O documento já deu direito a Vasconcelos de receber uma parcela de R$ 1,8 milhão, em dezembro de 2019, além de pagamentos mensais de R$ 200 mil. Com a pandemia, o valor foi repactuado, e o advogado passou a receber R$ 40 mil por mês do Vasco.

O segundo movimento deu-se na briga com a mesma empresa que cobra a dívida dos tempos do Café do Gol. Uma decisão judicial de 2001 estabeleceu uma multa para Romário, que retirou, sem autorização, equipamentos que a empresa havia instalado para operar o estacionamento no local. Como o montante não foi quitado na ocasião, foi se acumulando, mas, no ano passado, ele conseguiu reduzir o valor da autuação na Justiça.

Como diz já ter quitado mais do que o necessário, a partir de penhoras, Romário considera-se no direito de requerer R$ 6,9 milhões de volta e passou os direitos sobre o valor para o seu advogado, que acionou a empresa na Justiça exigindo o pagamento.

O valor das multas, no entanto, corresponde a apenas uma parte da dívida integral com a construtora, de R$ 24,6 milhões, valor que já transitou em julgado — o montante total é decorrente de perdas e danos e rompimento unilateral do contrato. A empresa considera que o valor excedente das multas deve ser subtraído da dívida total e, em reação, entrou com uma queixa-crime na Justiça, acusando Romário e seu advogado de fraude processual, por transformarem em crédito o que seria, na verdade, uma dívida.

Ao se manifestar a favor da marcação de uma audiência entre as partes para resolver a questão, o promotor Márcio Almeida Ribeiro da Silva afirmou em petição que a acusação “narra, em tese, fato criminoso expondo adequadamente circunstâncias de seu suposto cometimento”. A juíza Simone Cavalieri Frota informou, em despacho, que a audiência será marcada quando o atendimento ao público se normalizar, já que a pandemia de coronavírus provocou mudanças na rotina do Poder Judiciário.

Entre maio de 2016 e julho de 2017, o mesmo advogado retirou do tribunal e ficou com os autos de um dos processos em que Romário é cobrado por credores. Os documentos só foram devolvidos depois do cumprimento de um mandado de busca e apreensão. Questionado se há algum acordo firmado com Romário para repassar ao senador os valores que já recebeu ou venha a receber, o advogado afirmou que a reportagem cria “situações permeadas de falácias” e que não “deve nenhuma satisfação” aos repórteres. Romário foi procurado via assessoria de imprensa, mas não se manifestou.

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